5 de fev. de 2009

Mauá

Lembro da vez em que estive no paraíso, sim, já passei as férias por lá.

Cruzada ingrata, essa minha, descrever o paraíso.

Creio que tudo começa com a estrada de chão batido, caminho para os portões de entrada principal. Um caminho arborizado, onde prostitutas escorrem de suas folhas e deitam-se, nuas, pelo seu caminho. A estrada para o paraíso não deve ter mais que cinco quilômetros, mas, como devem imaginar, o caminho parece ficar cada vez mais longo. O cheiro inconfundível de sexo, toma o ar, o longo e arborizado caminho deste paraíso. Existem outras rotas que se pode seguir para chegar até lá, mas, este me foi ensinado assim e não arrisco tomar nenhum outro caminho desde então.

Ao chegar aos portões do paraíso, mulheres esculpidas em bronze e decoradas com flores lhe oferecem vinho e cerveja. Sim, cerveja. Longos caminhos de espelhos percorrem um grande vale, o maior jamais visto. Neste vale de espelhos, encontrei a última pessoa que poderia imaginar por ali: eu.

Entre tantos reflexos, achei aquele que estava me faltando, há muito. Minha imagem escarrada, com um sorriso largo e fixo, quase como se alguém tivesse rasgado meu rosto e remodelado daquela maneira. “Ai está você!”, exclamei. Minha imagem sorria. Alguns dizem que obtiveram respostas de seus reflexos, obviamente não poderia acreditar em malucos. Todos sabem que os reflexos não respondem com palavras, N-U-N-C-A!

Gibraltar, o aborígene. Tinha o tamanho de um átomo e a sede de saber de uma criança de 3 anos. Ele descansava em minhas botas de couro ressecadas. Pensei estar com o calçado errado para perambular pelo paraíso. Minha sombra paquerava borboletas as esmagando com os polegares. É assim que as sombras costumam dizer “eu te amo”. Excelente tática.

Mais tarde percebera que Gibraltar descansava em paz. Não se distribuíam talco no paraíso (pude perceber), e cara, estava quente lá.

Palhaços aspiravam as nuvens feitas de cocaína, as únicas virgens que restavam, tentavam modificar suas datas de nascimento. A maioria no paraíso era de Sagitário ou Leão, percebi que astrologia tinha um grande impacto na cultura local, lá, no paraíso.

Por fim, exausto, deitei na grama repleta de conchas brancas. Observava uma nascente de espumas e bolhas, apenas alguns metros de distância. Uma sereia me dizia que tudo ficaria bem. Eu acreditei, enquanto as prostitutas vendiam meus órgãos pela internet.

Aaah, saudades do paraíso.

3 de fev. de 2009

Miss Fevereiro

Fevereiro

Estou observando a minha vida no espelho. Ossos fortes, traços firmes, rugas, trapézio, barriga desleixada, cicatrizes. Algumas cicatrizes não são visíveis ao olho do ser humano, mas, estão ali.

Fevereiro, existe algo nisso que me incomoda, o mês de fevereiro. Talvez por ele ser tão peculiar entre os doze. E ser tão diferente entre doze semelhantes, é algo louvável e intrigante. Fevereiro tem a vida curta, porém, não menos intensa. Nada impede que grandes acontecimentos ocorram entre seus 28 ou 29 dias. O mês que nos deixa mais velhos, com eficiência e rapidez impressionantes.

Eu a conheci logo após a Bianca. Mas, lembro ter me apaixonado muito depois. Sim, lembro do exato momento em que me apaixonei. Mas não uma paixão boba, passageira. Uma paixão intensa, um amor verdadeiro e incondicional. Talvez, o sentimento mais puro e genuíno que um dia terei. Alguns podem dizer com quantos anos ou em que época de suas vidas sentiram o amor pela primeira vez, pouquíssimos podem determinar com tamanha precisão, quase que cirúrgica, o momento em que PERCEBERAM que estavam de frente a um dos sentimentos mais assustadores e dolorosos da vida de qualquer ser humano. Eu sei quando me apaixonei, eu estava lá!

Terceira série. Descia as escadas do colégio, ia beber água. Ela na cantina, esperava a merenda. Algo de estranho acontecia, eu olhei para ela, em sua calça de abrigo, cabelos castanhos lisos e olhos que mudavam de cor, e eu sentia algo diferente. Estava nervoso pela primeira vez perto dela. Uma amiga comum, de todos os dias e de tantas brincadeiras e brigas. Deveria continuar em frente, mas, algo me disse para ir beber água. Eu o fiz, e olhei novamente para ela. Seu sorriso fez meu coração pulular, minha respiração estava mais forte, senti uma eletricidade em todo o meu corpo, uma adrenalina.. o que haviam colocado naquela maldita água?!
Enfim, ela me chama. Pede ajuda com sua mochila. Os poucos anos seguintes, que muito se passaram, maravilhosos.
Tudo isso por causa de alguns segundos. Os segundos, tão displicentemente menosprezados, me marcaram muito mais do que 22 anos. O que daria para voltar aqueles poucos segundos, onde senti que estava vivo e pensava que tudo ia ficar bem.

Sinto sua falta, miss Fevereiro.