15 de mai. de 2009

Sangue e uísque (reciclagem)

Meus lábios ficam rachados no frio. Sempre que chega o inverno, eles ficam embotados. Um gosto de sangue na boca, portanto, para mim o inverno tem gosto e é de sangue e uísque.

Eu tinha meus bons 18 anos. Bebia como sempre. Estava sentado virado para a pista e com os lábios rachados. Banhava-os no meu velho e companheiro Natu. Sentia uma dor amortecida e estranha. Parado e bêbado como sempre.
Tinha chegado com uma garota morena com uma mecha cor de laranja na frente, baixinha (as baixinhas são as melhores), de olhos claros e com uma tatuagem acima da cintura.. perto lá do rabo. Junto com ela mais dois caras dos quais nunca fui muito com a cara. O problema é que estávamos unidos pela maldita noite.
A música como sempre era uma merda. A morena estava dançando. Ela dançava com uns manés. Eu era o senhor “cool”. Não dançava em absoluto. Quem passou a adolescência inteira bebendo e reclamando não sabe dançar, fato. Eu bebo, é isso que faço (ou fazia).
Um ilustre panaca sentou-se ao meu lado. Pegou uma garrafa de cerveja e falou algo para mim. Eu não dei a menor bola. Ele me cutucou e voltou a falar:

- Cara! Ela tá afim de ti!
- Eu percebi algo – disse.
- É.. é.. ela tá afim sim.

Mordi o lábio. Estava grosso e seco. Eu podia cortar qualquer língua com aqueles lábios. Sangue e uísque.

Ele disse mais uma porção de coisas que não ouvi direito.. Minha condição surda o fez tomar a importante decisão de levantar-se e ir cheirar no banheiro. Ao menos o espelho lhe garantiria algum contato visual.

Ela voltou, com um brilho de suor na testa e com sede. A vadia atacou meu Natu.

- Bah! – fez uma careta – que coisa forte!
- É pra ser. Isso é bebida de homem! – mordendo os lábios.
- Tu tá sangrando!

Ela atacou minha boca áspera. Saímos dali. Não paguei as bebidas. Ninguém nos parou na porta. Me levou aos tropeços a sua casa. Eu morava perto e ninguém precisava saber disso. Entramos naquela moradia pequena, fria, escura, feita de madeira. Uma casa bem bonita e fria. Um cachorro anão e peludo pulou em mim. Ela ficou todo abobalhada e ficou beijando o cachorro.

- Onde fica o banheiro? – perguntei.
- Ali, atrás daquela porta, querido.

“Querido”?!

Mijei.

Voltei.

Ela tirou a roupa, era mais velha que eu. Talvez uns 3 ou 4 anos. Sua tatuagem revelada por inteiro. Um coração com asas e alguma coisa escrita no meio. Me sentei no sofá. Ela fez quase todo o trabalho. Eu mordia o lábio.

Sangue e uísque.