5 de dez. de 2006

Marteladas

Telefone toca. Olho para o relógio com certas dificuldades de foco. 9 horas da manhã. Era uma segunda-feira. "Alguém morreu", foi o primeiro pensamento que me passou pela cabeça. Levantei. Meu dente doía muito. O telefone não parava de buzinar. Não tinha alguém naquela casa (tão importante assim ao menos não tinha), para receber uma ligação as 9 horas da manhã...e numa segunda-feira. Cacete!

-Alô.
-Oi..adivinha quem está falando?!

Uma coisa que não suportava era adivinhações numa manhã de segunda-feira. Havia descoberto naquele instante. Eu fiquei quieto tirando uma remela dos olhos.

-É a Juliana. Como vai menino?!
-Não tão menino assim.
-Como assim?!
-Estou ficando velho.

Ela riu.

-Que tens feito da vida afinal?!
-Não muita coisa.
-Como assim?!

Tinha esquecido como ela era irritante. Nos conhecemos 7 anos antes desse telefonema inoportuno, ela tinha um corpo mais ou menos, mas tinha grandes e lindos olhos azuis, e lábios carnudos. Usava um perfume que me irritava as narinas e me dava nojo quando estava de ressaca. É difícil manter uma relação estável quando ela é um dos motivos pelo qual você vomita.

-Não tem muito o que explicar. Tenho dormido muito eu acho..

Meu dente doía muito. Estava com sede.

-Só um instante Juliana. Eu já volto.
-O.K

Fui até a cozinha me arrastando com uma impressionante dificuldade. Estava em dúvida se era uma segunda mesmo. A geladeira estava vazia. No fundo dela tinha alguma comida velha e uma caixa de suco natural. Quem comprou tal coisa?! Não tinha mais cerveja. Peguei o suco. Voltei ao telefone e sentei numa cadeira. Ela gostava de tagarelar. Ia ser uma manhã longa.

-Voltei..
-Sabe, eu escrevi um livro!
-É?!
-Sim, sim.
-Sobre o quê?
-Sobre minha vida.
-Egocêntrica.

Ela riu. Eu não tinha feito nenhuma piada.

-Esqueci como você era engraçado – ria ela de sua maneira irritante – eu sonhei com você dia desses.
-Ah é?!

Meu dente doía muito. Acho que tomei todo o conteúdo da caixa em um único gole.

-Sim.

Um silêncio seguiu-se. Eu estava ocupado demais em desmontar a caixa de suco para perceber que ela queria que puxasse algum assunto.

-Acho que te vi no centro um dia antes - ela disse afinal- Engraçado não é?
-Acho que não. Eu não saio muito de casa.
-O que?! Logo tu?!
-Sim. Logo eu.

Ela riu.

-Você está em meu livro, sabia?!

Meu dente doía muito.

-Como poderia saber?

Pedi licença e fui até o banheiro. Abri minha boca e a examinei rapidamente. Uma bola de carne viva estava escondendo meus incisivos. Doía muito. Deveria ir ver isso num médico. Abri uma gaveta de uma penteadeira que estava ali há incontáveis anos. Peguei o martelo e bati na testa três vezes. Cambaleei, mas não desmaiei. O sangue correu grosso pela minha testa e entrou em meus olhos. Cambaleei até o telefone.

-Voltei.
-Então?
-Então o que?!

Tinha esquecido a dor no meu dente. O sangue entrava em meus ouvidos, o som estava abafado. Não enxergava muito também.

-O que acha de estar em meu livro?
-Acho que deveria ganhar alguma coisa em troca, não?!

Ela riu. Não tinha feito piada.

-Sabe, tu foi a minha pior foda. De toda a minha vida.
-Ah é?!
-É!

Ela riu durante alguns segundos. Minha cabeça latejava. Minha visão voltara. O telefone estava repugnante, uma massa viscosa de sangue grosso o adornava. Parecia mais uma obra de arte do que um aparelho telefônico.

-E isso tá no teu livro também? – perguntei.
-Ah, claro que sim!
-Ah, bom.
-Isso te incomoda?
-Não. O livro é teu oras.
-Não. Ter sido minha pior transa.
-Não muito na verdade.
-É mesmo?
-Sim.
-Você pensa em mim? – disse na voz mais manhosa que conseguia.

Passei a mão na testa. Meu dente voltara à doer.

-Não.
-Não?!
-Não.
-Nem uma vez pensou em mim em todos esses anos?!
-Acho que não.

Silêncio.

-Estou namorando agora.
-Hum, que bom.
-Está namorando alguém?
-Não.
-Por que não?!
-Por que sim?
-Mas eu não gosto dele.
-Por que está namorando com ele então?
-Comodidade. Acho..

Silêncio. Tinha sangue dentro do ouvido. Não sabia se ela tinha parado de falar ou eu de ouvir.

-Ele não é tão bonito – disse ela numa voz trêmula- não quanto você.

Ainda ouvia.

-Mas, ele não é tão ruim quanto você de cama. Não é excepcional também.
-Poucos são – disse num bocejo.
-É. Acho que sim.
-Só um pouco.

Voltei ao banheiro. Mais três na testa. Cai no chão. Após alguns segundos, muito tonto, eu me levantei e voltei ao quarto. Levei o martelo por segurança.

-Que dia é hoje afinal?! – disse eu numa voz espantosamente grossa.
-Segunda, querido.
-Hum..
-Tu tinha um corpo incrível. Adorava seu corpo.
-Obrigado – disse eu na minha voz ainda irreconhecível.
-Tu não queres vir aqui?!
-Onde?
-Aqui em casa? Eu moro no mesmo lugar ainda.

Eu estava muito tonto. Senti vontade de vomitar.

-Eu odiava aquele perfume teu – disse – me fazia vomitar.
-O que te fazia vomitar era todas aquelas bebidas que tu ingeria querido.
-Não. Tenho certeza que era teu perfume.

Silêncio. Peguei o martelo.

-Mas, vem pra cá.
-Pra quê?!
-Oras, tu não sabe pra quê?!
-Não tens namorado?!
-Isso não te impediu da primeira vez. Te lembra?
-Não.

Era mentira. O namorado dela estava fazendo um teste para as forças armadas, há sete anos atrás. Ele tinha ido para o Rio de Janeiro, foi quando eu a conheci e lhe dei a pior foda da vida dela. Mas a negação encurtaria a minha parte da conversa.

-Hum. Mas, te lembra onde eu moro certo?! – disse ela na voz manhosa novamente.
-Não.
-Ai! Pega uma caneta aí querido.
-Peguei – disse eu com as mãos na cabeça e não pegando porra nenhuma.

Ela deu o endereço. Eu fingi que anotara. Ela deu uma leve risada.

-Tu melhorou um pouquinho não?! – perguntou a infeliz.
-Provavelmente não. Devo ter piorado se queres saber.
-Isso é possível?!

Ela riu.

-Tu vai passar aqui mais tarde, não?! – perguntou.

Senti que a conversa estava finalmente terminando.

-Passo. Passo sim.
-Que bom.

Silêncio.

-Bom – disse eu após alguns segundos- então mais tarde nos veremos.
-Tá querido. Só uma coisinha.
-O quê – suspirei.
-Você ocupa metade de meu livro.
-E daí?!
-Achei que deveria saber.
-Hum. Certo, certo.
-Beijos amor.
-Beijos.

Ela desligou. Ela sempre desligava antes. Eu deixei o telefone fora do gancho. Guardei o martelo. Joguei fora a caixa destroçada de suco de laranja. Deitei...dormi.

14 comentários:

Anti disse...

Bêbados. Tsc tsc.

Anônimo disse...

Ah, a indiferença! *suspira*

Anônimo disse...

Perdeu uma puta foda!!!

Mas eu també, teria dormido.

E desligado o telefone muito antes.

Desligue na cara e diga que caiu.

A lo MSN.

Edison Rodrigues disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Edison Rodrigues disse...

perdi foi uma puta..rs

Anônimo disse...

Sim, "puta foda", "foda puta" tanto faz.

Já perdeu mesmo.


Inda bem.

Anti disse...

Ou não.

Anônimo disse...

Martelo X Foda...

Anônimo disse...

Martelo X Foda...

Anti disse...

ciberdek flooder.

Anônimo disse...

tem família q só serve pra inche o saco memo... não sei nem pq q fazem família... vão tomá no cú

Felipe Selles disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

kkkk muito bom velho
achei esse blog na comu no buk
curti o conto , vou dar mais umas vasculhadas
abraço!!!

Anônimo disse...

mazá..brigado pela presença! aquele abraço